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quarta-feira, 26 de novembro de 2014

   Após uma palestras sobre as eleições presidenciais de 2014, Gabriel e eu decidimos pegar uma carona até metade do caminho para casa para economizar o dinheiro do ônibus. Conseguimos com certa facilidade, umas garotas da Engenharia Civil nos ofereceram um espaço no carro e nos deixaram onde pedimos. Quando estávamos quase cruzando a esquina, fomos abordados por um grupo de moradores de rua pedindo por algumas moedas. Começamos então a conversar com dois deles, eu com Wagner e o Gabriel com o Professor. Curiosamente, o Professor conhece minha orientadora, Vera Cepeda. Que mundo pequeno! Mas voltarei a ele daqui a pouco.
    Wagner era um homem magro, altura mediana, pele parda e olhos verdes.Há dois meses vive em São Carlos, mas sua cidade natal é Mogi das Cruzes, para onde pretende voltar em Janeiro. "Ficar parado no mesmo lugar não vira nada", disse ele. Wagner cursou dois anos do mesmo curso que eu faço atualmente, Ciências Sociais, e ainda pretende voltar a estudar. Várias vezes ele olhava seus companheiros, dizia seus nomes e em seguida falava "esses são o social...você sabe o que é o social?"
   Tinha um carinho especial pelos cachorros que os acompanhavam; pegou o "Corinthiano" e  o colocou no meu colo para alisar seus pelos com as cores do time. Wagner gosta muito de futebol, foi aos estádios do Pacaembu inúmeras vezes assistir o timão. No meio da conversa, Gustavo, um amigo meu da Sociais, surge com um saco de pães para doar ao pessoal. Brincou um pouco com Wagner que vestia a camisa do Corinthians, como um bom são paulino que não perde a oportunidade de zoar o time adversário. E logo foi embora.
   Continuei o papo com Wagner, e nesse tempo ele me mostrou os machucados provocados pelas agressões policiais: hematomas e arranhões pela perna, braço e costela. Reclamou também que a assistência social de São Carlos tem dificultado seu acesso aos albergues, e por isso anda dormindo nas calçadas. Mas era forte, como dizia, "e da chuva é só se esconder." A cachaça é o que ajuda a enfrentar o dia a dia "nada fácil" que ele e seus companheiros vivem.

segunda-feira, 3 de novembro de 2014


              O amor não escolhe lugar para acontecer. Não exige carro, nem casa, nem muitas promessas. Apenas sonhos compartilhados e apoio mútuo. Era assim na simples vida de Edna e Elivaldo.
        Edna foi separada de sua filha pelo conselho tutelar e possui vários problemas com a promotoria, uma grande ironia em sua vida para quem um dia sonhou em exercer tal profissão. Não por menos, disse que se hoje pudesse retornar os estudos não faria mais Direito, mas sim Economia. A questão é que a dor da ausência da filha é amenizada pelo companheiro, com quem divide o leito de pedra. “Esse menino aqui foi a melhor coisa que encontrei em cinco anos”- disse ela. Estavam juntos há pouco tempo, e desde que se conheceram Edna disse que passou a sentir alguma paz (seu maior bem, como dito na primeira parte).
               Perguntei a Edna o que ela deseja de mais profundo para seu namorado. Ela me respondeu que deseja “um lugar para ele se estabilizar no meio da família”. Ficou claro para mim as razões por trás dessa resposta quando Elivaldo me contou sobre sua relação com a família e seu sentimento de dívida, em especial com o pai e a figura ausente da mãe.
               A vida de um casal sem-teto implica em novos obstáculos, como a falta de privacidade. O sexo deve ser feito em lugares abandonados, escondidos de possíveis curiosos e precavidos para não surpreender ninguém. Não é uma tarefa fácil encontrar lugares assim…
               Quanto aos dias de chuva, Edna e Elivaldo dormem clandestinamente na garagem de uma imigrante chinesa, e reclamam que pela manhã elas os acorda com batidas no portão e (prováveis) xingamentos em mandarim.
                 Ainda com essas dificuldades enquanto casal, além das que qualquer morador de rua enfrenta no dia-a-dia, Elivaldo e Edna persistem na jornada em busca de oportunidades para um dia saírem dessa precária condição. As rosas que vendem pelas ruas carregam em suas pétalas perfumadas a esperança de florescerem para uma nova vida.

Rosas de Elivaldo e Edna
 
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